Uma voltinha
por Santa Helena em dezembro de 1971
José Augusto Colodel
No ano de 1971 o Brasil ainda vivia sob a égide do "milagre econômico", encabeçado pelo super ministro da fazenda Antonio Delfin Neto. Brasil do tipo "esse é um país que vai pra frente" - que era o trechinho de uma música propalada pela ditadura e elites conservadoras. Nas prisões espalhadas pelo país o "pau comia solto" nas sessões de tortura contra supostos comunistas e subversivos. A seleção era tri-campeã e o Pelé já pensava em se aposentar do escrete canarinho. No Paraná do café quem governava era Haroldo Leon Peres. Político nomeado pelo regime e que teve o mandato cassado em novembro e substituído por Pedro Viriato Parigot de Souza. Lá em Washington, na Casa Branca, o presidente Emílio Médici, em conversa com o colega americano Richard Nixon, afirmava solene que "estava trabalhando" para derrubar o governo do socialista chileno Salvador Allende, o que aconteceria efetivamente em setembro de 1973.
E no Oeste paranaense, pelas ruas da cidade de Santa Helena o comentário entre os moradores era um só: - Está quase na hora de abandonar o bom e velho lampião!
E no Oeste paranaense, pelas ruas da cidade de Santa Helena o comentário entre os moradores era um só: - Está quase na hora de abandonar o bom e velho lampião!
Afinal de contas Santa Helena crescia num
ritmo estonteante e as necessidades da nova e próspera cidadezinha assim o
exigiam.
E esse era um sonho antigo que finalmente se
concretizava, mesmo porque já no início de 1971 o pessoal da Copel havia
iniciado estudos no sentido de que a rede de energia elétrica chegasse até o
perímetro urbano. A promessa era a de que no mais tardar até o final daquele
ano a luz chegaria – e, pasmem, não é que ela chegou!
A solenidade de inauguração ocorreu dia 27
de dezembro nas dependências da antiga Prefeitura, ali na Avenida Brasil, e foi uma beleza. População
reunida, políticos,bajuladores de todas as tonalidades, autoridades e tudo o
que era de praxe. Com o Arnaldo Weisheimer afastado coube ao vice-prefeito
eleito Orlando Webber representar o município e assinar a papelada. Como não
podia deixar de ser o Legislativo Municipal se fez presente em peso tendo à
frente o presidente José Biesdorf, acompanhado pelos vereadores Ernesto
Abrelino Thomé, Agílio de Oliveira, Primo Colombelli, Arcy João Panassolo,
Walter Edgar Galle, Vitalino Joaquim Soares, Arthur Schlitler e pelo secretário
executivo Hugo Afonso Scher.
A luz elétrica era uma realidade. Um
verdadeiro divisor de águas. A partir daqueles postes fincados pela Copel no
canteiro central da Avenida Brasil muita coisa mudou e Santa Helena nunca mais
foi a mesma. A história que o diga!
Dia de festa no centro da cidade - a antiga Praça Antonio Thomé serve de estacionamento. |
Diante da revelação desse acontecimento de
tamanhas repercussões futuras, floresceu a idéia de darmos um breve passeio,
olhando com o devido distanciamento histórico, algumas coisas e pessoas que
faziam e aconteciam naquela Santa Helena de 1971.
O município, instalado oficialmente em
1968, era ainda novinho, novinho em folha, mas a população já ultrapassava os
27 mil habitantes.
As terras colocadas à venda pela
Imobiliária Agrícola Madalozzo, sediada em Erechim, eram compradas a torto e a
direito. Quase não passava um dia sem que chegasse gente de mudança. Famílias à procura de um futuro promissor e aventureiros de boa ou má índole palmilhavam com olhos gordos as terras férteis da fronteira.
Existiam 3.500 propriedades agrícolas e
mais de 500 casas na sede municipal. A base da economia era a
agricultura, começando timidamente a ganhar ares de mecanização e a pecuária,
principalmente de leite. Além dessas, davam os ares da graça riquezas passageiras e bem vindas tais como o
café e o hortelã.
Na área educacional funcionava o Graciliano
Ramos, 8 escolas estaduais, 57 municipais, duas particulares e um jardim de
infância. A população professava seis religiões, com três paróquias e setenta
capelas.O interior era grande barbaridade!
Nos meios sociais a beleza da mulher local
se destacava com a estudante Edna Sanches, fã do Moacir Franco, signo de escorpião
e eleita Rainha da Rádio Nacional de São Paulo, pela cidade de Santa Helena.
Doente? Tenha calma. Quem precisasse de
remédio de dia ou de noite ia até a Farmácia São José, que tinha até filial em Moreninha. Se não
quisesse então que fosse até a Farmácia Paraná, do Manoel Casarotto, que
oferecia à clientela medicamentos dos melhores laboratórios e perfumaria em
geral.
Os viajantes eram bem recepcionados no
Turis Hotel, de propriedade do Peri Backer, solidamente construído na Avenida
Brasil e que oferecia como comodidades bar e churrascaria anexos, além de boas
camas com colchão de molas. Um requinte só. Já o La Paloma Hotel
disputava a farta clientela dispondo de bar, restaurante e dormitório,
alardeando um ambiente seleto e acolhedor. Bem frequentado também era o bar, hotel e restaurante Simeoni, comandado pelo Rizzieri
Simeoni. Seu lema: "servindo bem para servir sempre!". E em se falando de bar e
churrascaria tinha ainda a do Aquelino Paludo.
Para os motoristas locais e viajantes o
abastecimento de gasolina e óleo diesel ficava por conta do Posto Ipiranga,
onde também funcionava a Mecânica Santa Helena, especializada nos misteres dos
mais diversos motores e solda elétrica em geral. Tinha ainda o Posto Esso e o pioneiro Posto Fockink, do saudoso Normindo.
Mas quem quisesse andar alinhado tinha que
ir é na Alfaiataria Elite. Ali, o Alcides Sbardelotto passava os dias
confeccionando ternos para casamento e passeio. Além disso
ele forrava botões e tinha a mão certa para o feitio de calças esporte.
De portas abertas também estava a Comercial
Allegretti Ltda. A família, que havia chegado em 1962, mexia com quase tudo,
contando com um amplo estoque de secos e molhados, ferragens, tecidos,
armarinhos, motores, motos-serra, etecétera e tal.
Antiga Rodoviária, defronte ao Hotel Simioni. |
Na Avenida Brasil também estava instalada a
tradicional Loja Tupinambá, do tão conhecido Portelinha, vendendo a precinhos
camaradas tecidos e confecções de alta qualidade. Como dizia a propaganda
mesmo? “Venham todos e aproveitem pois
este é o endereço certo para uma boa compra”.
E no futebol que riu por último foi a
Sociedade Esportiva Palmeiras, legítima campeão de 1971, tendo como presidente
o Calixto Pratti.
Algumas coisas e pessoas que no longínquo e
saudoso 1971 faziam a história de Santa Helena. Algumas delas ainda estão por
aí e continuam a fazê-la. 1971, um ano em que o lampião cedeu espaço para a luz
elétrica, deixando na penumbra, mas não esquecido, um tempo que não volta mais.
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