terça-feira, 13 de dezembro de 2011

No Oeste do Paraná os súditos da rainha
e sua Fazenda Britânia

            A tão conhecida “Fazenda Britânia” era coisa de capitalista monopolista inglês, com libra e mil réis no bolso, chapéu coco, fraque e bengala.
       Lá pelo início do século XX – e assim o foi até o término da Primeira Grande Guerra (1914-1918) - a Inglaterra ainda reinava como potência econômica hegemônica e feito polvo  espalhava seus tentáculos imperialistas mundo afora. Impunha seus produtos industrializados a bel-prazer e explorava impiedosamente as abundantes riquezas naturais em suas inúmeras colônias e em dezenas de países sob a sua tutela. Suas marinhas de guerra e mercante reinavam incontestes em todos os meridianos e a libra esterlina era o dólar da época, ditando as transações comerciais. O Obama daquela época era o primeiro-ministro inglês Lloyd George, sem armas nucleares, mas com indisfarçável e ameaçador poder de fogo.
       No que dizia respeito ao Brasil; país rico, inexplorado e de quase inesgotável manancial, a presença política britânica era dominante, intransigente até. A república para nós ainda engatinhava. A classe política e a classe militar, emergentes desde o golpe de 1889, articulavam e mesquinhavam como nos bons e áureos tempos do império.
       Já no Estado do Paraná, com sua economia voltada para a produção da erva-mate, que desde os fins do período provincial se tornara a principal fonte de renda e sustentáculo das finanças públicas, tinha pouca voz e vez nos altos escalões da República. Quem comandava o timão da economia nacional era o café, produzido em ritmo crescente na Região Sudeste.

Londres em 1907
        Foi nesse Paraná marginal às grandes decisões nacionais que no ano de 1905 um grupo de empresários ingleses adquiririu do governo brasileiro uma enorme área de terras devolutas localizadas na Região Oeste, mais precisamente na margem esquerda do rio Paraná.
       Em 1907 a “Companhia de Maderas del Alto Paraná” recebeu autorização para funcionar em território oestino. A área foi ufanisticamente batizada de “Fazenda Britânia” e o simples ancoradouro mandado construir ganhou status de “Porto Britânia”. Diga-se de passagem que essa companhia, fundada em 1902, já era proprietária de grandes fazendas em São Paulo e no Pantanal de Mato Grosso, ambas destinadas à criação de gado.
       A companhia, que tinha como testa de ferro o político iguaçuense Jorge Schimmelpfeng, nada mais era do que mera ramificação de uma empresa inglesa muito, muito maior: a The Alto Paraná Development Company Ltd., com sede na cidade de Buenos Aires.
       Quanto ao “pedacinho de terra” em questão, objeto da transação, ele tinha perto de 275 mil hectares! Sua configuração era a de um retângulo quase perfeito, sendo que da margem do Paraná avançava em linha reta quase 80 quilômetros sertão adentro! Mas não ficou por aí a avidez imobiliária inglesa. Em 1909 a Companhia de Maderas del Alto Paraná gestionou junto ao governo estadual e não foi nada difícil comprar uma área contígua à Fazenda Britânia. Esta, englobava nada menos que 22 mil hectares!
       Ledo engano quem por ventura acreditou que os capitalistas ingleses comprariam essas terras com o propósito de iniciarem um projeto colonizador no Oeste paranaense, até então praticamente despovoado. O negócio era lucrar rapidamente e mandar os dividendos para Buenos Aires e daí para Londres. E o lucro fácil enjcontrava respaldo na extração da erva-mate nativa, da madeira, erva-cidreira e até de extrato de laranja apepú. Então, dê-lhe facão, dê-lhe machado!
       Vai daí que não mexeram uma palha para o início de alguma atividade agropecuária sistemática ou para abrir estradas dentro da imensa propriedade. Para quê? Os únicos caminhos existentes eram as trihas e picadas que ligavam os locais de coleta com o Porto Britânia. A prioridade era retirar em grande quantidade o que a terra gratuitamente oferecia e ponto final.
       Para a extração da erva-mate e madeira contavam exclusivamente com mão-de-obra paraguaia.
       A porta de saída dessa exuberância vegetal amealhada era o seu atracadouro particular, o Porto Britânia. E para exportar com maior agilidade os produtos retirados de dentro da fazenda os administradores ingleses providenciaram várias melhorias em suas instalações, dotando-as de armazéns para depósito da erva-mate e mercadorias diversas, escritório central, casa de hóspedes, administração, almoxarifado, oficina, casas para os funcionários, mangueirão, horta, etc. Conta-se também que constituíram um muito bem cuidado erval com cerca de 90 mil pés de onde eram feitas inclusive experiências para a obtenção de novas variedades de erva-mate.
       Deitou e rolou por mais de trinta anos até que a decadência da tão poderosa Fazenda Britânia, cujo auge fora alcançado durante a década de 1920, tivesse início. O processo deu-se a partir de 1939 quando a Inglaterra envolveu-se diretamente na Segunda Guerra Mundial. Antes disso, suas instalações foram parcialmente vdestruídas pela passagem da Coluna Prestes em 1924, ficando abandonadas até 1930.
       Em 1942 encerrou-se finalmente a longa permanência exploratória britânica em solo paranaense. Isto se deveu em parte à queda das exportações de erva-mate para o mercado platino, ao esgotamento progressivo das reservas de madeira e também em razão da pressão e proibição do governo brasileiro quanto à presença de estrangeiros em suas fronteiras em tempos de guerra.
       A Fazenda Britânia voltou a chamar a atenção em 1945, meses após o término daquele que foi o mais sangrento conflito da história da humanidade. Os ingleses tinham interesse na venda da propriedade e quem primeiro se interessou foram homens que teriam grande importância para a história recente oestina. Seus nomes: Alfredo Paschoal Ruaro, Alberto Dalcanale, Willy Barthe e Curt Bercht. Seu empreendimento: a Industrial Madeireira Colonizadora Rio Paraná S.A., mais conhecida como Maripá.
       Em 1946 o negócio foi fechado e a partir de então teve início uma nova etapa da colonização do Oeste paranaense. Mas, e vocês já devem saber, essa é uma outra história.