terça-feira, 31 de julho de 2012


Uma voltinha por Santa Helena em dezembro de 1971

 A novidade era a luz da Copel


José Augusto Colodel


     No ano de 1971 o Brasil ainda vivia sob  a égide do "milagre econômico", encabeçado pelo super ministro da fazenda Antonio Delfin Neto. Brasil do tipo "esse é um país que vai pra frente" - que era o trechinho de uma música propalada pela ditadura e elites conservadoras. Nas prisões espalhadas pelo país o "pau comia solto" nas sessões de tortura contra supostos comunistas e subversivos. A seleção  era  tri-campeã e o Pelé já pensava em se aposentar do escrete canarinho. No Paraná do café quem governava era Haroldo Leon Peres. Político nomeado pelo regime e que teve o mandato cassado em novembro e substituído por Pedro Viriato Parigot de Souza. Lá em Washington, na Casa Branca, o presidente Emílio Médici, em conversa com o colega americano Richard Nixon, afirmava solene que "estava trabalhando" para derrubar o governo do socialista chileno Salvador Allende, o que aconteceria efetivamente em setembro de 1973. 
      E no Oeste paranaense, pelas ruas da cidade de Santa Helena o comentário entre os moradores era um só: - Está quase na hora de abandonar o bom e velho lampião!
    Afinal de contas Santa Helena crescia num ritmo estonteante e as necessidades da nova e próspera cidadezinha assim o exigiam.
     E esse era um sonho antigo que finalmente se concretizava, mesmo porque já no início de 1971 o pessoal da Copel havia iniciado estudos no sentido de que a rede de energia elétrica chegasse até o perímetro urbano. A promessa era a de que no mais tardar até o final daquele ano a luz chegaria – e, pasmem, não é que ela chegou!
     A solenidade de inauguração ocorreu dia 27 de dezembro nas dependências da antiga Prefeitura, ali na Avenida Brasil, e foi uma beleza. População reunida, políticos,bajuladores de todas as tonalidades, autoridades e tudo o que era de praxe. Com o Arnaldo Weisheimer afastado coube ao vice-prefeito eleito Orlando Webber representar o município e assinar a papelada. Como não podia deixar de ser o Legislativo Municipal se fez presente em peso tendo à frente o presidente José Biesdorf, acompanhado pelos vereadores Ernesto Abrelino Thomé, Agílio de Oliveira, Primo Colombelli, Arcy João Panassolo, Walter Edgar Galle, Vitalino Joaquim Soares, Arthur Schlitler e pelo secretário executivo Hugo Afonso Scher.  
     A luz elétrica era uma realidade. Um verdadeiro divisor de águas. A partir daqueles postes fincados pela Copel no canteiro central da Avenida Brasil muita coisa mudou e Santa Helena nunca mais foi a mesma. A história que o diga!
Dia de festa no centro da cidade -
a antiga Praça Antonio Thomé serve de estacionamento.

      Diante da revelação desse acontecimento de tamanhas repercussões futuras, floresceu a idéia de darmos um breve passeio, olhando com o devido distanciamento histórico, algumas coisas e pessoas que faziam e aconteciam naquela Santa Helena de 1971.
     O município, instalado oficialmente em 1968, era ainda novinho, novinho em folha, mas a população já ultrapassava os 27 mil habitantes.
     As terras colocadas à venda pela Imobiliária Agrícola Madalozzo, sediada em Erechim, eram compradas a torto e a direito. Quase não passava um dia sem que chegasse gente de mudança. Famílias à procura de um futuro promissor e  aventureiros de boa ou má índole palmilhavam com olhos gordos as terras férteis da fronteira.
     Existiam 3.500 propriedades agrícolas e mais de 500 casas na sede municipal. A base da economia era a agricultura, começando timidamente a ganhar ares de mecanização e a pecuária, principalmente de leite. Além dessas, davam os ares da graça riquezas passageiras e bem vindas tais como o café e o hortelã.
     Na área educacional funcionava o Graciliano Ramos, 8 escolas estaduais, 57 municipais, duas particulares e um jardim de infância. A população professava seis religiões, com três paróquias e setenta capelas.O interior era grande barbaridade!
     Nos meios sociais a beleza da mulher local se destacava com a estudante Edna Sanches, fã do Moacir Franco, signo de escorpião e eleita Rainha da Rádio Nacional de São Paulo, pela cidade de Santa Helena.
     Doente? Tenha calma. Quem precisasse de remédio de dia ou de noite ia até a Farmácia São José, que tinha até filial em Moreninha. Se não quisesse então que fosse até a Farmácia Paraná, do Manoel Casarotto, que oferecia à clientela medicamentos dos melhores laboratórios e perfumaria em geral.
     Os viajantes eram bem recepcionados no Turis Hotel, de propriedade do Peri Backer, solidamente construído na Avenida Brasil e que oferecia como comodidades bar e churrascaria anexos, além de boas camas com colchão de molas. Um requinte só. Já o La Paloma Hotel disputava a farta clientela dispondo de bar, restaurante e dormitório, alardeando um ambiente seleto e acolhedor. Bem frequentado também era o bar, hotel e restaurante Simeoni, comandado pelo Rizzieri Simeoni. Seu lema: "servindo bem para servir sempre!". E em se falando de bar e churrascaria tinha ainda a do Aquelino Paludo.
      Para os motoristas locais e viajantes o abastecimento de gasolina e óleo diesel ficava por conta do Posto Ipiranga, onde também funcionava a Mecânica Santa Helena, especializada nos misteres dos mais diversos motores e solda elétrica em geral.  Tinha ainda o Posto Esso e o pioneiro Posto Fockink, do saudoso Normindo.
     Mas quem quisesse andar alinhado tinha que ir é na Alfaiataria Elite. Ali, o Alcides Sbardelotto passava os dias confeccionando ternos para casamento e passeio. Além disso ele forrava botões e tinha a mão certa para o feitio de calças esporte.
     De portas abertas também estava a Comercial Allegretti Ltda. A família, que havia chegado em 1962, mexia com quase tudo, contando com um amplo estoque de secos e molhados, ferragens, tecidos, armarinhos, motores, motos-serra, etecétera e tal.
Antiga Rodoviária, defronte ao Hotel Simioni.

     Na Avenida Brasil também estava instalada a tradicional Loja Tupinambá, do tão conhecido Portelinha, vendendo a precinhos camaradas tecidos e confecções de alta qualidade. Como dizia a propaganda mesmo?  “Venham todos e aproveitem pois este é o endereço certo para uma boa compra”.
     E no futebol que riu por último foi a Sociedade Esportiva Palmeiras, legítima campeão de 1971, tendo como presidente o Calixto Pratti.
     Algumas coisas e pessoas que no longínquo e saudoso 1971 faziam a história de Santa Helena. Algumas delas ainda estão por aí e continuam a fazê-la. 1971, um ano em que o lampião cedeu espaço para a luz elétrica, deixando na penumbra, mas não esquecido, um tempo que não volta mais.